'DEU JEITO' O ADIAMENTO DAS FESTAS OFICIAIS DO 25 DE ABRIL

Com a ‘ajuda’ de Luís Montenegro, Tony Carreira passa fasquia de meio milhão de euros em quatro meses

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Pedro Almeida Vieira|30/04/2025

Foi uma sorte para Tony Carreira o adiamento decretado pelo Primeiro-Ministro das festividades do 25 de Abril para o Dia do Trabalhador. Se assim não fosse, o cançonetista mais popular de Portugal dificilmente teria agenda para actuar, mesmo que num mini-concerto de uma hora, para duas mil pessoas, nos jardins do Palácio de Belém. De facto, na noite de 24 de Abril, Tony Carreira cantou a partir das 22 horas, no Barreiro, num concerto comemorativo dos 51 anos da Revolução dos Cravos. A entrada, tal como amanhã, foi gratuita, embora tenha custado aos contribuintes — ainda que paga pelos cofres da autarquia da Margem Sul — um total de 73.185 euros, com IVA incluído.

Ignora-se se Luís Montenegro vai reviver o dueto (desafinado) que fez com Tony Carreira em Dezembro de 2019 no programa ‘Casa da Cristina’, na SIC, tal como também se ignora quanto custará o concerto com entrada gratuita nos jardins da residência oficial do Primeiro-Ministro. O gabinete de Luís Montenegro não respondeu aos insistentes pedidos do PÁGINA UM sobre esta matéria — que, aliás, seria escusado solicitar se a Presidência do Conselho de Ministros tivesse já colocado, como determina a lei, o contrato no Portal Base. Certo é que Tony Carreira não costuma ser barato; pelo contrário, é o artista com cachets mais elevados.

Dueto na SIC em 2019 vai repetir-se?

E isso tem-se notado ainda mais nos últimos anos. Por exemplo, o ano de 2025 vai ainda com apenas quatro meses completos, e Tony Carreira já garantiu uma agenda recheada de actuações financiadas por dinheiros públicos, mesmo se todos anunciam “entrada gratuita”. Segundo os dados publicados no Portal BASE — que compila os contratos públicos celebrados por entidades do Estado —, estão já contratados, até ao momento, 10 espectáculos com o artista, num total de 466.944,05 euros com IVA incluído, pagos por municípios, através de ajuste directo, sem concurso público. Será previsível que, com o contrato para a actuação nos jardins de São Bento, a fasquia do meio milhão de euros seja ultrapassada em apenas quatro meses.

Tony Carreira tem-se destacado por ser um dos mais caros artistas portugueses, no sentido emocional e financeiro, sobretudo por actuar, em regra, sozinho, apenas com músicos acompanhantes. De entre os contratos deste ano, o de valor mais baixo (45.510 euros com IVA) foi assumido pelo Município de Alter do Chão, no distrito de Portalegre, e o mais elevado pelo Município de Vila Nova de Gaia, no distrito do Porto.

No primeiro caso, o concerto realizou-se no dia 25 deste mês, nas Festas de São Marcos, naquela vila alentejana — o que inviabilizaria, assim, também, um eventual pulo a São Bento, se não tivesse ocorrido o adiamento —, enquanto o contrato com Gaia serviria para a autarquia socialista abrilhantar a inauguração do Pavilhão Nelson Mandela. Este concerto esteve agendado para o dia 11, mas este centro multiusos acabou por não estar ainda concluído. Para amanhã está previsto um concerto em Gaia com Mickael Carreira, filho de Tony Carreira, mas não foi possível, em tempo útil, apurar se este espectáculo servirá para cumprir o contrato.

Jardins de São Bento.

Além dos contratos com o Barreiro, Gaia e Alter do Chão, pelo menos outras sete autarquias também já decidiram este ano contratar Tony Carreira com verbas públicas. O município de Mértola já garantiu a presença do cantor nas Festas da Vila, em 21 de Junho, e não se fez rogado em pagar 49.200 euros (com IVA), enquanto a empresa municipal FESNIMA, de Olhão, adjudicou por 59.206 euros (com IVA) um contrato para um espectáculo inserido nas Festas da Cidade, a realizar em 16 de Junho.

Para não se ser exaustivo, a agenda de Tony Carreira deste ano tem passagens pela Feira do Fumeiro de Vinhais, pela FACIT em Tábua, pela FIAPE em Estremoz, pela Festa do Emigrante em Chaves, pela Ficabeira em Arganil. A visibilidade de Tony Carreira tem um valor médio, este ano, a rondar os 52 mil euros com IVA.

A prática de ajuste directo, muito comum nos contratos culturais, continua a permitir às autarquias evitar processos de concurso ou consulta prévia, bastando-lhes justificar a escolha do artista e adjudicar directamente o valor orçamentado. Em todos os contratos agora divulgados, os valores encontram-se dentro do limite legal (até 75 mil euros para prestações de serviços), mas levantam questões sobre critérios de selecção artística e repetição dos mesmos nomes em diferentes municípios, com cachets bastante elevados e sem concorrência.

Tony Carreira actuou no dia 24 de Abril no Barreiro e no dia seguinte em Alter do Chão (na foto). Sem o adiamento das festividades do 25 de Abril em São Bento, o cançonetista não teria agenda.

Em grande parte dos concertos, Tony Carreira beneficia também dos valores de produção, uma vez que uma parte destes contratos públicos é celebrada através da sua empresa Regi-Concerto. De entre os concertos já previstos em contratos, este ano, a empresa de Tony Carreira facturará 370.230 euros com IVA. Mas a Regi-Concerto também produz outros concertos, como se verificou no recente espectáculo de Passagem de Ano em Lisboa.

Poucos meses depois de ver Carlos Moedas a entregar-lhe a medalha de mérito cultural, a Regi-Concerto de Tony Carreira teve uma oferta de mão-beijada concedida pela Câmara Municipal de Lisboa: organização das festas de Ano Novo, no valor de 265 mil euros, incluindo IVA. Com um cartaz que não custava mais de 80 mil — constituído pelo veterano José Cid e pelo seu próprio filho Mickael —, e como a EGEAC ainda assumiu diversas despesas, Tony Carreira terá tido um lucro, sem subir ao palco lisboeta, próximo dos 150 mil euros.

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