ANGEL MINDS FACTUROU QUASE 450 MIL EUROS EM 2022

Anjos vs. Joana Marques: ano do vídeo polémico até foi o mais rentável do último quinquénio para os irmãos Rosado

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Pedro Almeida Vieira e Elisabete Tavares|17/06/2025

Limites da sátira, impacto económico do humor – mesmo que mau –, crises de acne, triatlo para combater a depressão e até lapsos de memória de um gerente. De tudo isto se falou na sessão de hoje do julgamento que coloca no banco dos réus a humorista Joana Marques, processada pela dupla musical Anjos, que reclama uma indemnização de 1.118.500 euros por alegados danos patrimoniais e não patrimoniais. Entre os prejuízos invocados contam-se o cancelamento de espectáculos e contratos de patrocínio, bem como danos à imagem e reputação dos irmãos Rosado.

A polémica remonta ao dia 24 de Abril de 2022, quando os Anjos interpretaram o Hino Nacional antes da prova de MotoGP no Autódromo Internacional do Algarve. A actuação – marcada por problemas técnicos – gerou uma onda de críticas nas redes sociais, amplificada por Joana Marques, que publicou no Instagram uma montagem vídeo da performance dos Anjos intercalada com reacções negativas de jurados do programa televisivo Ídolos. Na legenda, acrescentou a provocatória frase: “Será que foi para isto que se fez o 25 de Abril?”

Apesar de, na sessão de hoje, o pai dos irmãos Rosado – gerente da Angel Minds – ter manifestado lapsos de memória quanto à evolução dos rendimentos da empresa que gere a carreira dos músicos, o Página Um analisou as contas anuais da Angel Minds entre 2019 e 2023, último ano disponível. E, na verdade, se os Anjos têm motivo de queixa, será unicamente da pandemia, porque não se vislumbra qualquer impacto económico adverso derivado do vídeo de Joana Marques.

Com efeito, apesar de a maior parte dos contratos de espectáculos ser formalizada através da empresa Senhores do Ar II –, detida pelo agente dos irmãos Rosado, é na Angel Minds que os artistas recebem os seus cachets líquidos.

Ora, segundo as contas dessa sociedade, o melhor ano do quinquénio foi precisamente 2022, o ano da controvérsia com Joana Marques, registando vendas e prestações de serviços no valor de 448.571 euros – valor que representa uma recuperação significativa face aos dois anos pandémicos.

Em 2019, último ano pré-covid, a Angel Minds tinha facturado cerca de 402 mil euros, mas esse valor caiu para menos de 90 mil euros em 2020 e apenas 105 mil euros em 2021, reflectindo os constrangimentos generalizados no sector cultural. Já em 2023, apesar de uma descida para 270 mil euros, não há qualquer indício que relacione esta quebra com o episódio humorístico.

A actuação dos Anjos a cantar o hino em 25 de Abril de 2022 foi alvo da sátira de Joana Marques.

Essa tese desfaz-se também ao analisar os contratos públicos de actuação dos Anjos, quase sempre celebrados com municípios. Entre 2019 e 2025, a dupla somou 63 espectáculos adjudicados por câmaras municipais ou empresas municipais, mantendo uma presença regular no circuito institucional.

Em 2019, em plena normalidade, realizaram 19 espectáculos em municípios como Albufeira (com dois contratos distintos), Oeiras, Portel, Vieira do Minho, Beja, Penela, Aljezur, Lamego, Guarda, Batalha, Ourique, Calheta de São Jorge, Mealhada, Marco de Canaveses, Seixal, Ferreira do Zêzere, São Brás de Alportel e também com a empresa municipal Prazilândia, da Castanheira de Pêra. Este ano serve de referência para o nível de actividade pré-pandemia.

Em 2020 e 2021, a pandemia reduziu drasticamente a actividade artística. Em 2020, realizaram apenas três espectáculos (Pinhel, Lagoa e Vila Franca de Xira); e em 2021 também três (Alandroal e duas vezes no Seixal).

Chegado o ano de 2022, considerado de retoma, os Anjos celebraram 12 contratos públicos. E importa destacar que apenas um – com o município da Azambuja – foi assinado antes da publicação do vídeo de Joana Marques, a 25 de Abril. Todos os outros 11 contratos foram posteriores, incluindo actuações em Santarém (com um contrato de 60 mil euros), Moura, Fornos de Algodres, Corroios, Pombal, Paredes, São João da Pesqueira, Sabrosa, Estarreja, Miranda do Corvo e novamente Azambuja.

Joana Marques

Os valores por actuação em 2022 rondaram, por norma, os 17 mil euros, valor até ligeiramente superior ao verificado antes da pandemia. Além disso, os “fornecimentos e serviços externos” da Angel Minds – que reflectem sobretudo os cachets pagos aos artistas – atingiram em 2022 o valor recorde de quase 410 mil euros, face aos cerca de 285 mil euros em 2019, 82 mil euros em 2020 e 120 mil euros em 2021. Mesmo admitindo que alguns contratos pudessem ter sido cancelados, seria necessário um corte de mais de 50 espectáculos para justificar o valor de indemnização pedido pelos Anjos.

Em 2023, embora tenha havido uma ligeira redução do número de contratos, os Anjos actuaram em 11 eventos públicos, com presença em Reguengos de Monsaraz, Lisboa, Borba, Ferreira do Alentejo, Moita, Vila Flor, Ílhavo, Águeda, Redondo, Tábua e Coruche. A actividade regular prosseguiu em 2024, com concertos em Braga, Moura, Vieira do Minho, Seixal, Portimão, Oeiras e Aljustrel, com cachets que, em regra, rondaram os 20 mil euros.

Em 2025, os concertos já adjudicados incluem actuações em Chamusca, Vizela, Trofa, Estremoz, Póvoa de Varzim, Sesimbra e Amarante – neste último caso, a actuação realizou-se a 7 de Junho, com um cachet de 34.200 euros. Mas ainda não estão registados outros concertos já agendados. Só para este mês, segundo a sua página no Facebook, os Anjos têm agendados sete concertos, quatro dos quais em apenas uma semana.

Sérgio e Nelson Rosado: os Anjos foram criados em 1999.

Ou seja, apesar de uma ligeira redução no número de concertos, os valores contratados aumentaram, o que invalida qualquer narrativa de prejuízo reputacional ou boicote decorrente do vídeo humorístico.

Acrescente-se ainda que, segundo as contas da Angel Minds, apesar de funcionar essencialmente como canal de recepção dos cachets dos irmãos Rosado, apresenta uma situação financeira sólida, com resultados transitados (lucros acumulados) na ordem dos 270 mil euros e saldos em depósitos bancários superiores a 300 mil euros.

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