PEQUENA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA ESTATAL VAI GASTAR 1,2 MILHÕES DE EUROS EM ALUGUERES DE LONGA DURAÇÃO
Banco Português de Fomento vai oferecer ‘carros desportivos’ aos directores de topo

Numa sociedade guiada por valores materiais e ‘status’, um banqueiro tem de “parecer bem” e não pode ser visto num carro de gama baixa. Mas em Portugal basta ser director intermédio de um banco estatal, mesmo pequeno, para almejar sorte similar. Para quê ser austero quando se pode conduzir um topo de gama pago pelo erário público?
Talvez tenha sido esse princípio de ouro da hierarquia social, de mostrar que se tem “status”, que fez com que o Conselho de Administração do Banco Português de Fomento (BPF), que é um banco estatal, lançasse um concurso público para encomendar, através de um contrato de aluguer de longa duração (ALD) de um total de 23 viaturas SUVs para a sua direcção de topo.

O BPF é um banco estatal de apoio ao investimento, mas de pequeníssima dimensão face à mastodôntica Caixa Geral de Depósitos. Apesar de serem instituições financeiras muitíssimo distintas, basta dizer que a CGD teve um lucro de 1.735 milhões de euros no ano passado, enquanto o BPF teve resultados positivos de de 18 milhões de euros. ↓
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Mas isso pouco parece importar na hora de mostrar ‘status’. O BPF vai desembolsar perto de 1,2 milhões de euros (981 mil euros, acrescido de IVA) para o aluguer de longa duração de 21 viaturas para dirigentes de topo, por cinco anos, e mais duas de luxo, por quatro anos, que incluirão vários extras.
O concurso do banco público está, neste momento, a decorrer até finais deste mês, encontrando-se divido em cinco lotes, o que significa que pode ser entregues a diferentes empresas.

Segundo o caderno de encargos, consultado pelo PÁGINA UM, não são esquecidos alguns pormenores de luxo e distinção. O primeiro lote a concurso refere-se à encomenda de “uma viatura tipo SUV, com motorização híbrido plug-in/gasolina, tração integral, cinco portas” com uma potência combinada de 455 cavalos, de cor “preto ónix”.
O equipamento mínimo obrigatório inclui “lotação máxima: sete lugares; cinco portas; depósito combustível 71 litros, pintura metalizada, tecto panorâmico, câmara 360º, vidros traseiros escurecidos”. A cor interior exigida é “nórdico acolchoado em carvão, jantes 21″ com 5 raios múltiplos pretos, corte em diamante”.
Só este veículo terá um custo base de aluguer de 62.400 euros (76.752 euros com IVA), ou 1.600 euros por mês. A este valor acresce a despesa 3.150 euros com custos administrativos e operacionais.

O lote 2 abrange a encomenda de uma viatura sedan/limousine de cor “metalizada preto Obsidian”, com motorização híbrido plug-in/gasolina, de cinco portas, e potência de 280 kw – 381 cv. O custo desta viatura será de 65.067 euros, com uma renda mensal de 1.356 euros, a que se somam custos administrativos e operacionais de 2.600 euros.
As especificidades mínimas obrigatórias incluem “pintura metalizada, jantes liga leve 18″, Apple car play, bancos dianteiros ajustáveis eletricamente”. Os interiores têm de ser em “couro Artico/microcut preto”. A encomenda exige ainda como extras um “pack desportivo premium, jantes 5 raios 18”, vidros traseiros
escurecidos”.
O lote 3 abrange 16 viaturas “tipo SUV, motorização híbrido plug-in/gasolina, cinco portas”. O custo será de 767.520 euros, com rendas mensais por viatura de 799 euros, num total de 12.784 euros, a pagar durante cinco anos.
Estas viaturas têm de ter transmissão automática de
oito velocidades, tracção às quatro rodas, barras de tejadilho (talvez para meter pranchas de surf, bicicletas ou caiaques), volante desportivo e bancos dianteiros também desportivos. Presume-se que são os “essenciais” para qualquer profissional “financeiro”. Como extras obrigatórios, o BFE exige ainda um “pack desportivo e vidros com protecção solar”.
Das 16 viaturas, oito terão de ser de cor “cinza prata Space” e oito de cor “preto Sapphire metalizada”, enquanto os interiores ostentarão uma “combinação de Alcantara M/Veganza, preto/pesponto de contraste em azul”.

O lote 4, por sua vez, diz respeito a quatro veículos tipo SUV, de motorização híbrido/gasolina, com cinco portas, pintura metalizada e equipadas com sensores de estacionamento, cruise control adaptativo, jantes de liga leve de 17 polegadas, Apple Car Play, faróis led, câmara de assistência ao estacionamento, caixa automática e barras de tejadilho. Duas serão de cor “cinza Vapour” e duas de cor “preto Ónix”. Os interiores já serão mais “baratinhos”, apenas revestidos com “tecido antracite”. No caso deste lote, a despesa ficará em 191.880 euros, com uma renda global de 3.198 euros.
Por fim, o lote 5 abrange uma viatura “SUV, híbrido/gasolina, cinco portas, sete lugares” com um custo de 47.970 euros e uma renda mensal de 799 euros. As especificidades mínimas obrigatórias incluem “pintura metalizada, barras de tejadilho, sistema de
estacionamento traseiro e câmara traseira, vidros eléctricos
condutor e passageiro, ar condicionado automático, luzes de
circulação diurna em led, limpa vidros automático, faróis led e jantes de liga leve”.
Como é habitual, o ALD de viaturas por entidades públicas é feito com o argumento de que a despesa engloba encargos com seguros, impostos e serviços de manutenção. Contudo, os veículos não ficam na posse do Estado, não podendo assim ser disponibilizados a outras entidades públicas após alguns anos de uso.

Note-se que a despesa que o BPF pretende agora fazer com aluguer de viaturas para dirigentes contrasta com os 599.335 euros que o banco público gastou nos últimos cinco anos para o mesmo tipo de contratação, segundo dados do Portal Base.
Com efeito, em 2021, o BPF gastou 165.970 euros (sem IVA) num contrato de aluguer de nove viaturas para os seus quadros. Em 2023, efectuou três contratos de 130.216 euros, 140.006 euros e 19.800 euros. Por fim, em 2024, fez um novo contrato para o aluguer de uma viatura de 31.272 euros. No total, estes contratos resultam na soma de 599.335 euros (com IVA).
Assim, nos últimos cinco anos, somando todos os contratos, o BPF assumiu uma despesa de mais de 1,8 milhões de euros no aluguer de veículos para os seus quadros.