NOVO-RIQUISMO: CERIMÓNIA AO ESTILO DE 'GALA DE PRÉMIOS' DUROU TRÊS HORAS

Tomada de posse em Oeiras: Isaltino ‘chuta’ 75 mil euros do erário público para a Federação Portuguesa de Futebol

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Elisabete Tavares e Pedro Almeida Vieira|31/10/2025

A tomada de posse dos novos órgãos autárquicos de Oeiras, realizada esta tarde nas instalações da Federação Portuguesa de Futebol (FPF), na Cruz Quebrada, teve uma despesa de quase 75 mil euros suportada pelo erário municipal. Isaltino Morais prescindiu de espaços públicos sem custos e decidiu fazer uma autêntica ‘gala de entrega de prémios’, com música e chamada ao palco dos eleitos, numa encenação que fez entrar 60,5 mil euros acrescidos de IVA nos cofres da FPF Events, uma sociedade detida integralmente pela Federação e criada em 2013 com capital social de apenas um euro.

O negócio foi formalizado ontem, e já executado integralmente hoje, foi enquadrado como “contratação excluída II”, um regime excepcional do Código dos Contratos Públicos. E foi também usada outra exceppção para haver dispensa de redução a escrito do contrato, alegando-se que os serviços seriam executados em menos de 20 dias após a adjudicação e não estavam sujeitos a fiscalização prévia do Tribunal de Contas. Ou seja, Isaltino Morais tratou um gasto de 75 mil euros como se estivesse a comprar um papo seco na padaria da esquina.

Com efeito, na prática, a Câmara Municipal de Oeiras considerou que a organização de uma ‘gala de tomada de posse’ — incluindo o aluguer do espaço, apoio técnico e logístico e outros serviços prestados pela FPF Events — podia ser tratada como uma prestação de curta duração e, portanto, dispensar a celebração de contrato escrito. Miguel Pinto Luz, como ministro das Infraestruturas, e Patrícia Costa, como secretária de Estado da Habitação, estiveram presentes na tomada de posse de Isaltino Morais, antigo ministro e militante do PSD.

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O enquadramento jurídico, todavia, é altamente discutível e levanta fortes dúvidas de legalidade. Segundo um jurista ouvido pelo PÁGINA UM, a utilização desta figura é “um expediente anómalo e desajustado”, considerando que “a norma prevista no artigo 95.º do CCP visa simplificar pequenas aquisições de bens móveis ou serviços correntes — por exemplo, uma reparação urgente, uma entrega pontual de materiais ou a contratação de um transporte —, e não pode ser invocada para o aluguer de espaços para eventos de natureza protocolar, sobretudo quando envolve montantes superiores a 60 mil euros e entidades públicas de grande visibilidade.” Além disso, sublinha ainda que a modalidade da “contratação excluída” deve aplicar-se apenas a situações operacionais transitórias, nunca a eventos públicos planeados e com carácter cerimonial.

Ou seja, neste caso, não havia qualquer urgência, nem necessidade pública imediata, antes uma opção de conveniência política com um custo elevado a si associado. O acto viola o espírito do regime de contratação pública, que exige transparência, publicidade e proporcionalidade. “A dispensa de formalidades não é sinónimo de dispensa de responsabilidade”, salienta o mesmo jurista.

Em todo o caso, saliente-se que a informação sobre o contrato (não escrito) foi já publicado no portal BASE. Esta decisão de Isaltino Morais é tanto mais polémica quanto existiam alternativas municipais gratuitas ou de custo reduzido, como o Palácio do Marquês de Pombal — sede institucional do concelho — ou o Taguspark, onde a autarquia detém uma participação. Ao optar pela Cidade do Futebol, o município contribuiu indirectamente para as receitas da Federação Portuguesa de Futebol, presidida por Pedro Proença — que esteve presente na cerimónia —, através da sua subsidiária comercial.

A FPF Events, constituída em 2013, tem por objecto social a organização de eventos desportivos, incluindo “venda de bilhetes e de pacotes de hospitalidade”. Nos relatórios e contas da Federação, a empresa é considerada de relevância material reduzida e encontra-se excluída da consolidação financeira, sendo apenas registada por equivalência patrimonial. Em 2024, segundo dados públicos, a sociedade registava movimentações marginais, sem actividade regular expressiva.

A cerimónia desta tarde — transmitida online e com formato de gala — incluiu um momento musical com o fadista Pedro Moutinho e a presença do presidente cessante da Assembleia Municipal, Elisabete Oliveira, bem como do presidente reeleito da Câmara, Dr. Isaltino Morais. O evento teve protocolo formal, vídeo promocional e recepção de convidados, em tudo semelhante a um evento corporativo de representação.

Miguel Pinto Luz, como ministro das Infraestruturas, e Patrícia Costa, como secretária de Estado da Habitação, estiveram presentes na tomada de posse de Isaltino Morais, antigo ministro e militante do PSD.

Em síntese, Isaltino Morais abre o jogo do seu terceiro mandato ‘chutando’ o Código dos Contratos Públicos para canto e abrindo alas para um golo de quase 75 mil euros do ex-árbitro Pedro Proença à conta do aluguer da FPF Arena Portugal, na Cidade do Futebol, por cerca de três horas. E o jogo, que durará mais quatro anos, só adora se iniciou.

Para o seu terceiro mandato, Isaltino Morais, com o seu movimento INOV, conta com uma esmagadora maioria, sendo coadjuvado na vereação por oitos partidários (Francisco Rocha Gonçalves, Sílvia Breu, Pedro Patacho, Armando Cardoso Soares, Teresa Bacelar, Nuno Neto, Susana Duarte e Mariana Coelho), estando a oposição representada apenas por uma vereadora do PS (Ana Sofia Antunes) e um do Chega (Pedro Frazão).

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