GRANDE LISBOA É A ÚNICA REGIÃO ACIMA DA MÉDIA EUROPEIA

PIB por habitante: Em 30 anos, o país estagnou e há regiões piores do que em 1995


Durante trinta anos, Portugal percorreu um ciclo económico que, observado de perto e sem artifícios retóricos, revela um dado central tão incómodo quanto persistente: o país não convergiu com a média europeia em termos de riqueza por habitante e continua estruturalmente dependente de um único pólo de excepção — a Grande Lisboa. Todos os restantes territórios ficaram aquém dessa fasquia, e nenhum conseguiu, em três décadas, superar a média da União Europeia em Produto Interno Bruto (PIB) per capita ajustado ao poder de compra.

A análise do PÁGINA UM aos dados oficiais do Instituto Nacional de Estatística (INE) — revelados hoje para o ano de 2024 — confirma que, em comparação com a média da União Europeia, não há nada de substancialmente diferente agora do que se verificava há 30 anos, mais precisamente em 1995.

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Saliente-se que o PIB per capita ajustado ao poder de compra não mede salários nem rendimento disponível, mas o valor económico médio gerado por pessoa, corrigido pelas diferenças de preços entre países e regiões, sendo a média da União Europeia fixada em 100. É, por isso, um dos instrumentos mais robustos para avaliar a convergência económica real.

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O primeiro dado a destacar é simples e devastador: Portugal, enquanto país, encontrava-se em 1995 nos 80,9% da média europeia. Em 2004 subiu ligeiramente para 82,6%, caiu de forma acentuada para 76,7% em 2014 — no rescaldo da crise financeira e da intervenção externa — e recuperou em 2024 para 82,4%. Ou seja, ao fim de trinta anos, Portugal regressou praticamente ao ponto de partida. Não houve convergência estrutural. Houve apenas oscilação em torno de um patamar persistentemente inferior à média europeia.

Este padrão de estagnação nacional torna-se ainda mais claro quando se observa o território. A Grande Lisboa surge, desde 1995, como a única região portuguesa sistematicamente acima da média da União Europeia. Em 1995, registava 131,4 pontos (face à média 100 da União Europeia); em 2004 atingiu um pico de 140,9; em 2014 recuou para 123,3; e em 2024 voltou a subir para 128,9. Mesmo com oscilações, mantém-se sempre num patamar claramente europeu, muito acima do resto do país.

white and blue boat on dock during daytime

Nenhuma outra região conseguiu este feito. Nem o Norte industrial, nem o Centro, nem o Algarve turístico, nem sequer regiões pontuais com dinâmicas específicas conseguiram, em três décadas, ultrapassar a média europeia. O Norte passou de 68,0% em 1995 para 70,8% em 2024, regressando apenas agora ao nível relativo de há trinta anos. O Centro seguiu uma trajectória em forma de U pouco animadora: 66,9% em 1995, depois 70,0% em 2004, a seguir 66,4% em 2014 e 70,7% em 2024. Melhorias episódicas, seguidas de recuos, sem qualquer transformação estrutural visível.

Um dos aspectos mais relevantes desta análise é constatar que, em 2024, subsistem ainda várias regiões portuguesas abaixo dos 60% da média da União Europeia. Entre elas destacam-se o Alto Tâmega e Barroso, com 55,7%, o Tâmega e Sousa, com 53,1%, as Terras de Trás-os-Montes, com 58,8%, as Beiras e Serra da Estrela, com 57,3%, e talvez o caso mais surpreendente de todos: a Península de Setúbal, que se situa apenas nos 55,4%.

A Península de Setúbal é, aliás, uma das regiões cujo trajecto relativo é mais preocupante — sobretudo pela sua proximidade e interdependência com a Grande Lisboa —, porque se encontra hoje numa posição claramente pior do que aquela que ocupava em 1995, quando atingia 66,1% da média da União Europeia. Em 2014 havia já descido para 53,7% e, apesar de uma recuperação marginal na última década, fixa-se agora, em 2024, nos 55,4%. Trata-se, assim, de uma das regiões que evidencia uma perda estrutural de convergência ao longo de três décadas.

an aerial view of a marina with boats in the water

Há, de resto, outras regiões próximas da capital que apresentam igualmente uma evolução negativa quando comparadas com 1995. É o caso da região do Oeste, que passou de 70,8% da média europeia em 1995 para 62,5% em 2024, e da Lezíria do Tejo, que desceu de 78,8% para 68% no mesmo período. Em ambos os casos, o padrão é o de regressão relativa prolongada, contrariando a narrativa de convergência sustentada.

Também o Alentejo Litoral regista uma ligeira descida face a 1995, passando de 95% para 93,5%. Ainda assim, e apesar desta erosão relativa, continua a ser a segunda região mais bem posicionada do país, beneficiando da presença do complexo industrial de Sines.

Em sentido inverso, a região que mais progrediu em termos relativos ao longo deste período é a Região Autónoma da Madeira. Em 1995 encontrava-se nos 65,9% da média europeia e atinge agora, em 2024, os 88,3%. A Madeira é, neste momento, a quarta região do país melhor posicionada, apenas atrás da Grande Lisboa, que atinge 128,9%, do Alentejo Litoral, com 93,5%, e do Algarve, com 89,2%.

brown bridge with light

O Alentejo Central apresenta igualmente um ligeiro agravamento do seu posicionamento relativo: em 1995 situava-se nos 71,2% da média da União Europeia e encontra-se agora, em 2024, nos 70,5%, traduzindo uma estagnação prolongada, com ligeira tendência descendente.

O quadro global revela, contudo, um padrão estrutural persistente e difícil de ignorar: todas as regiões a norte de Lisboa permanecem abaixo dos 80% da média da União Europeia. Mesmo a Área Metropolitana do Porto se situa apenas nos 78,9% em 2024, quando em 1995 atingia 84,6%, sendo também uma das regiões que apresenta uma deterioração relativa face a 1995 — e uma das poucas que, em termos comparativos, se encontra hoje pior do que estava há quase três décadas.

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