FILIPE ALVES E A SUA MULHER, TAMBÉM JORNALISTA, DETÊM AINDA AGÊNCIA DE VIAGENS E DE PUBLICIDADE

Director do Diário de Notícias é sócio-gerente de uma empresa de comunicação social que está ‘fora da lei’


O director do Diário de Notícias, Filipe Alves, é sócio de pelo menos duas sociedades comerciais ligadas ao sector da comunicação social, ambas constituídas com a sua mulher, Liliana Gomes, actual directora de Informação em Portugal da Record Europa, estação televisiva brasileira detida pelo líder religioso Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD).

Uma dessas empresas, a Parágrafo Mágico, não apresentou, até à data, as demonstrações financeiras de 2024, legalmente exigidas até meados de Julho passado, encontrando-se em violação do dever de transparência imposto pela lei portuguesa. Ignora-se, assim, quais são os serviços prestados e se tanto Filipe Alves como Liliana Gomes estão a receber verbas dos seus empregadores ou até de entidades que deles beneficiem.

Filipe Alves (primeira à esquerda) com Marco Galinha, principal accionista da Global Notícias.

A Parágrafo Mágico, foi constituída em Janeiro de 2023 e tem como objecto social a edição de jornais, revistas e outras publicações periódicas. A empresa, com Filipe Alves como sócio-gerente, tem sede formal no Funchal, num endereço amplamente utilizado como escritório virtual, isto é, uma morada que não corresponde a um espaço físico de trabalho permanente.

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Apesar de exercer actividade num sector particularmente sensível do ponto de vista do escrutínio público, a Parágrafo Mágico não procedeu à entrega da Informação Empresarial Simplificada (IES) dentro dos prazos legalmente estabelecidos, o que impede o conhecimento público das suas contas anuais na Base de Dados das Contas Anuais.

Saliente-se que a IES é uma declaração anual obrigatória para todas as sociedades comerciais, através da qual são prestadas, de forma integrada, informações fiscais, contabilísticas e estatísticas. A sua submissão permite o depósito automático das contas e a sua consulta pública, constituindo um pilar essencial da transparência empresarial.

Filipe Alves, director do Diário de Notícias

Além da questão ética, o incumprimento desta obrigação pode dar origem a coimas, impedir o acesso a apoios públicos, bloquear actos societários e, em situações persistentes, fundamentar processos de dissolução administrativa da sociedade.

Para além da Parágrafo Mágico, Filipe Alves e Liliana Gomes constituíram, em Março de 2022, uma outra empresa, a Atlas Extrovertido. Também com sede formal no Funchal e igualmente registada no mesmo endereço de escritório virtual, esta sociedade apresenta um objecto social invulgarmente vasto, que inclui actividades de agência de viagens e operadores turísticos, através do site Dare to Travel, a edição de jornais e revistas, a consultoria (não especificada), a promoção e publicidade, a organização de eventos e a formação (não especificada). Destaque-se que o Estatuto do Jornalista impede profissionais deste sector executarem actividades de promoção e de publicidade.

De acordo com a prestação de contas relativa a 2024, entretanto entregue, a Atlas Extrovertido registou proveitos de cerca de 34 mil euros, não tendo, contudo, qualquer trabalhador ao serviço. Tal circunstância indica que a actividade da empresa assenta exclusivamente na prestação directa de serviços pelos próprios sócios, Filipe Alves e Liliana Gomes, embora não seja possível apurar, com base na informação disponível, qual a actividade principal efectivamente exercida, nem quem são os clientes da sociedade.

Liliana Gomes, directora de informação da Record Europa em Portugal, canal televisivo detido pelo fundador da IURD.

As empresas, apesar de exercerem supostamente actividades no sector da comunicação social, não estão registadas na Entidade Reguladora para a Comunicação Social como detentoras de órgãos de comunicação social. Em todo o caso, a Atlas Extrovertido viu o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) recusar-lhe, no ano passado, a marca “Revista Financeira”, mas entretanto, já este ano, a Parágrafo Mágico conseguiu registar as marcas “Revista Financeira – Quem Decide Lê” e “Canal Financeiro – A Economia em Directo”.

Estas duas empresas têm como beneficiários efectivos o casal de jornalistas, casados em regime de comunhão de adquiridos, conforme registos oficiais do Registo Central do Beneficiário Efectivo. Embora tanto Filipe Alves como Liliana Gomes exerçam funções profissionais em Lisboa — residindo na zona de Santo Amaro —, optaram por fixar a sede social das sociedades na Região Autónoma da Madeira, sem que seja conhecida qualquer actividade operacional local.

O PÁGINA UM questionou Filipe Alves sobre a falta de contas públicas da Parágrafo Mágico, sobre a natureza concreta da actividade desenvolvida pela Atlas Extrovertido, sobre a opção por sedes virtuais na Madeira e sobre eventuais conflitos de interesses decorrentes da acumulação de funções editoriais de topo com actividades empresariais no sector da comunicação social. Até ao momento, não foi obtida qualquer resposta.

Filipe Alves e Liliana Gomes. Foto: DR (retirada do mural público de Liliana Gomes no Favebook com data de 2014).

Este silêncio contrasta com o facto de, em Agosto passado, quando a Parágrafo Mágico, de que é sócio-gerente, já se encontrava em situação de incumprimento declarativo, Filipe Alves ter assinado no Diário de Notícias e no Dinheiro Vivo artigos noticiosos e mesmo artigos de opinião, atirando suspeitas sobre a transparência e legalidade do PÁGINA UM, apesar de as contas deste jornal serem públicas e não ter sido apontada, em concreto, qualquer violação de normas legais nem fiscais.

Acresce que a própria empresa detentora do Diário de Notícias, a Global Notícias, assumiu publicamente encontrar-se em falência técnica, com capitais próprios negativos próximos dos 20 milhões de euros, sem que tenha ainda divulgado as contas relativas a 2024, desconhecendo-se, por essa via, o montante exacto das suas dívidas ao Estado.

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